30/05/2020

A Lista de Schindler - crítica




"Aquele que salva  uma vida, salva o mundo."


Um dos filmes mais emocionantes e reflexivos sobre os horrores da Segunda Guerra Mundial, o filme mais elogiado de Steven Spielberg e uma homenagem a um oficial alemão que se tornou um herói entre os judeus.
Mais do que um filme, uma forma de mostrar ao mundo uma profunda e emocionante história real.


A Lista de Schindler foi lançado em 1993, dirigido por Steven Spielberg, com trilha sonora de John Willians, escrito por Steve Zailian baseado no livro A Arca de Schindler, de Thomas Keneally, que por sua vez é baseado nos relatos de Poldek Pfefferberg (falarei sobre ele mais pra frente).
O filme é estrelado por Liam Neeson como Schindler, Ben Kinglesy como o contador judeu Itzhak Stern e  Ralph Fiennes como o oficial da SS, Amon Goth.

Altamente aclamado, o filme recebeu inúmeros prêmios, incluindo 3 Globos de Ouro e 7 Baftas. Recebeu ainda 12 indicações ao Oscar, levando 7 deles:  Melhor Direção de Arte, Melhor Montagem, Melhor Fotografia, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Trilha Sonora. Melhor Diretor e Melhor Filme.
O American Film Institute o coloca como o oitavo melhor filme americano da história e é considerado pela crítica especializada como um dos melhores filmes já feitos, tendo aclamação universal.

Uma verdadeira obra-prima do cinema e um retrato da história de Oskar Schindler e dos 1.200 judeus salvos por ele durante o regime nazista nos anos de 1939 a 1945.
Inteiramente gravado em preto e branco (Spielberg quis que o filme tivesse essa fotografia tanto para manter o toque de documentário do filme como para homenagear o estilo de cinema do expressionismo alemão, usado nos filmes da época), a obra possui quase três horas e meia de duração mas posso garantir: você fica tão imerso no filme que nem vê o tempo passar.




Quando comecei a escrever este artigo, fiz uma pesquisa tanto sobre o filme quanto a história real e me deparei com muitas informações interessantes. E se eu colocasse tudo aqui, ficaria um artigo imenso. De modo que tentarei resumir o que me for possível e explicar um pouco sobre a intensidade e importância não apenas deste filme, mas da história real que ele conta.
Assim, resumidamente, o filme conta a história de um empresário (e membro do partido nazista) que chega a Alemanha inicialmente planejando enriquecer com a guerra, mas ao conviver com os judeus e  se deparar com os horrores aos quais eles estavam sendo submetidos durante o nazismo, decide empregá-los em sua fábrica de panelas e munições, para assim protegê-los da perseguição e campos de concentração, salvando suas vidas.
Contar mais do que isso, seria revelar informações importantes ao decorrer do filme, de modo que recomendo que o assista com atenção e sensibilidade.

Embora a obra foque (obviamente) mais em Schindler, ela também retrata de uma forma angustiante e realista a situação cruel, desesperadora e aterrorizante que os judeus (e consequentemente todos aqueles que não concordavam com o nazismo) foram submetidos durante o regime nazista.
Spielberg  confessou que inicialmente teve medo que as pessoas não acreditassem se tratar de uma história real, tanto por causa da improbabilidade da trama, como pelo fato de ter sido dirigida por um cineasta como ele, e por isso gravou a cena final com os sobreviventes reais, salvos por Schindler.




Quem foi Oskar Schindler?

Schindler nasceu e cresceu na Morávia, e teve vários empregos antes de entrar na Inteligência Militar Nazista, em 1936 e em 1939 se tornou um membro do partido nazista. Nesse mesmo ano, Schindler adquiriu uma fábrica de utensílios esmaltados na Cracóvia (na Polônia) na qual empregou
1750 trabalhadores, dos quais uns mil eram judeus em 1944. Graças a seus contatos na Abwehr, pôde proteger a seus trabalhadores judeus da deportação e da morte nos campos de concentração nazista.

Inicialmente a intenção de Schindler era empregar funcionários judeus em sua fábrica por eles "custarem mais barato" e assim poderia aumentar seus próprios lucros, se aproveitando da falta de emprego e perda de bens que os judeus sofreram pelo regime nazista.. Porém, com o tempo, Schindler passou a empregar trabalhadores judeus que não precisava, assim protegendo-os de serem levados para os campos de concentração. Para isso, ele subornava oficiais do alto escalão nazista, alterava documentações dos funcionários e conseguia convencer de que sua empresa necessitava do trabalho de mulheres, crianças e deficientes físicos apenas para assim poder salvar essas pessoas.
Mesmo sendo uma fábrica de produção de armamentos e insumos militares, a produtividade dela era baixíssima: Schindler fazia questão de que seus funcionários não realizassem o trabalho corretamente. Durante os quatro anos de funcionamento, a fábrica produziu mercadoria defeituosa e muito pouco foi entregue ao exército alemão. Mas nesses quatro anos, Schindler conseguiu expandir as instalações da fábrica, criando uma clínica médica, uma cozinha e uma sala de jantar para os trabalhadores. 

Quando a Alemanha começou a perder a guerra em 1944, a SS começou a fechar os campos de concentração a leste e evacuar os prisioneiros para oeste. Schindler convenceu Amon Goth, o comandante do campo de concentração de Kraków-Płaszów a transferir a fábrica para Brünnlitz, poupando, assim, os seus trabalhadores da morte nas câmaras de gás. 
Schindler continuou a subornar os oficiais das SS para impedir o massacre dos seus empregados, até o final da Segunda Guerra Mundial. Assim, em maio de 1945 quando a guerra terminara, Schindler já havia gasto a sua fortuna em subornos e no mercado-negro para comprar provisões para os seus funcionários. 





Mas Oskar não foi um herói impecável ou um homem santo. Schindler era uma pessoa e como tal, tinha suas qualidades, seus defeitos, seus erros e seus acertos. Beberrão, mulherengo e interesseiro, era como muitos o definiam.
 Em 2004 foi lançada uma biografia sobre Schindler na qual o autor, David M. Crowle, procura mostrar um "outro lado" de Schindler (se bem que um pouco desse lado é mostrado no filme então não é novidade). O autor não diminui o heroísmo e a coragem de Schindler em salvar os judeus, mas salienta que essa atitude foi o resultado de um processo de transformação pessoal.

O biógrafo e historiador conta também que entrevistou dezenas dos judeus salvos por Schindler 
e pôde constatar gratidão irrestrita para com seu benfeitor. 

Schindler é o modelo perfeito de como uma pessoa é capaz de ter empatia, de compreender a situação do outro e procurar fazer algo para mudar em prol de um bem maior. Ninguém é perfeito e certamente Schindler teve seus preconceitos e pré-conceitos mas se arrependeu deles, pôde enxergar a realidade da sociedade e do governo em que vivia e teve a coragem e a humanidade de querer fazer algo para mudar, para lutar e salvar o maior número possível de pessoas. Inclusive há uma cena emocionante no filme que retrata muito bem o sentimento de dor em Schindler quando, mesmo tendo recebido a gratidão dos judeus que salvou, ele chora porque dizia que deveria ter tentado salvar muito mais.

Após o fim da guerra, Schindler manteve contato com vários judeus que havia salvo, incluindo Stern e sobreviveu pobre, com as doações dos "judeus de Schindler" que vieram do mundo todo.
Oskar Schindler morreu em 9 de outubro de 1974 Hildesheim, Alemanha. Ele f
oi o único membro relacionado ao partido nazista a ser sepultado em Jerusalém, no Monte Sião. 
 Em sua lápide estão gravados os dizeres: em hebraico, "Justos entre as nações"; e  em alemão: "Salvador Inesquecível de 1200 Judeus Perseguidos".

 
Oskar Schindler                             lápide de Schindler em Jerusálem 


 Parte da lista de Schindler contendo alguns
nomes de judeus salvos por ele

Curiosidades Interessantes


- Poldek Pfefferberg foi um dos "Judeus de Schindler", e fez como sua missão de vida contar a história de seu salvador. Pfefferberg tentou produzir uma cinebiografia sobre Oskar Schindler com a Metro-Goldwyn-Mayer em 1963, mas o acordou não vingou. Em 1982, Thomas Keneally publicou Schindler's Ark, um romance que ele escreveu depois de ter conhecido Pfefferberg. Sid Sheinberg, então presidente da Music Corporation of America, enviou ao diretor Steven Spielberg um resenha do livro feita pelo The New York Times. Ao tomar conhecimento de tal história, o diretor convenceu a Universal Pictures a comprar os direitos do livro para produzir o filme. Então, em 1983, Spielberg conheceu Pfefferberg e este perguntou quando que o diretor começaria a gravar. Spielberg respondeu: "Daqui há dez anos."

Mas, por quê tanto tempo?
Bom, na época (1983) Spielberg ainda estava receoso acerca de uma ascenção neonazista após a quedado Muro de Berlim. Assim, enquanto trabalhava no roteiro junto de Kennealy (que escreveu o livro A Arca de Schindler) Kurt Luedtke, Spiebelrg decidiu que iria terminar de produzir e gravar Jurassic Park primeiro pois sabia que não conseguiria filmar Jurassic Park depois de trabalhar em um filme intenso como A Lista de Schindler.

- A "Lista de Schindler" na verdade não era bem uma lista feita por ele. Eram diversas listas feitas tanto por ele quanto por terceiros. Ao todo foram nove listas, mas algumas não foram encontradas até hoje. As outras estão em exibição em museus.

Durante a angustiante cena do extermínio do gueto de judeus pelo exército nazista, no qual Schindler e sua esposa assistem impotentes, há a icônica garotinha do vestido vermelho - dentro das cenas em preto e branco, ela se destacava entre todos os personagens. Acompanhamos com os olhos (assim como Schindler) essa criança andando por entre todo o caos que acontece no gueto, até ela sumir e não ser mais mencionada.
Além de servir como um recurso narrativo de impacto para a história, ela não foi inserida ali ao acaso: essa garotinha realmente existiu e conseguiu sobreviver ao Holocausto. Seu nome era Roma Ligocka e em 2002 ela escreveu um livro (The Girl in the Red Coat - A Memoir) onde ela narra sobre os seus dias na guerra.





- Cada um dos três personagens centrais foram interpretados perfeitamente por seus atores, rendendo atuações fortes e emocionantes. Liam Neeson ganhou o papel que também era visado por Mel Gibson e Kevin Costner. Neeson encarnou Schindler de forma brilhante. Ralph Fiennes ficou tão real na pele do nazista Amon Goth que, quando Mila Pfefferberg, uma das sobreviventes do holocausto (que auxiliou com informações para o filme)  viu o ator montado no figurino do personagem, começou a tremer de medo porque, porque, nas palavras dela, ela não viu o ator e sim o próprio Amon Goth.

- Spielberg confessou que ficou satisfeito e realizado com este filme de uma forma que nenhum outro filme que dirigiu depois.

- O início do filme é em cores e apresenta uma família observando o Shabat. Quando a cor vai embora nos momentos iniciais, dá um modo para o filme onde a fumaça vem simbolizar os corpos sendo queimados em Auschwitz-Birkenau.
Apenas para que no final as imagens das velas reganham acolhimento quando Schindler permite que eles honrem o Shabat. Para Spielberg, elas representam "apenas um lampejo de cor, um lampejo de esperança".


Que equipe! 


É praticamente impossível não se emocionar com o filme. As cenas da invasão ao gueto de Cracóvia é de dar um nó na garganta e assistimos a toda aquela violência assim como Schindler: desesperado e impotente. A violência e maldade dos soldados nazistas é tão real e vívida que perturbadoramente conseguimos visualizar atitude semelhante á grupos extremistas pró-governo atuais.

As cenas dos campos de concentração, o desespero dos judeus no trem em direção aos campos, a crueldade doentia de Amon Goth, a emocionante conversa de despedida de Schindler e Stern, o desespero das mulheres judias sendo levadas para a câmara de gás, as crianças tentando sobreviver ao horror da perseguição, as mortes de inocentes apenas por eles serem o que são e a emoção do discurso de Schindler no último dia da fábrica ao final da guerra e seu pranto ao ser homenageado por todos aqueles que ele salvou, são capazes de nos levar ás lágrimas.
Porque tudo ali é dolorosamente real e tão presente e possível em nossa sociedade.Quem não se sentir profundamente tocado em, no mínimo, um momento do filme, pode se considerar uma pessoa perdida.

A Lista de Schindler não é um filme fácil ou leve para se assistir porém é um filme maravilhoso e extremamente necessário de ser assistido, contemplado e debatido. Uma reflexão trágica, perturbadora e belíssima sobre o poder de fazer o bem e de conhecermos um horror do qual jamais devemos desejar que torne a se repetir..



~*~

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6 comentários:

  1. ficou muito massa, miga! q bom q voltou!

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    1. Obrigada!
      Ah, aos poucos estou tentando voltar a ativa XD

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  2. Olá Tsu!
    Muito bom o texto. Confesso que ainda não assisti esse filme, mas sempre tive vontade. Os atos da segunda guerra realmente não devem ser esquecidos pela humanidade para que isso nunca mais volte a se repetir. Vou ver se me animo pra ver as 3h desse filme. Ainda não assisti O Irlandês por causa disso hahaha.

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    1. Olá!
      Então, assim que puder veja o filme! Ele é longo mas vale muito á pena.
      O Irlandês eu assisti, é bom mas não bom para levar o Oscar (como não levou). O Scorcese caprichou, mas não é o melhor filme dele mesmo tendo um baita elenco.

      Agora Schindler vai te emocionar.

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