25/05/2016

Teatro dos Contos de Fadas


Certos clássicos da TV, quando são realmente bons, tornam-se memoráveis em nossa mente, principalmente quando os vemos em nossa infância. E qual não é nossa surpresa quando, ao revermos já adultos, percebamos mais detalhes interessantes deixemos passar por conta de nossa inocência infantil. Revelando que uma mesma produção pode ser ao mesmo tempo infantil e adulta, dependendo da forma como que olhamos, sendo sempre assim interessante.
Teatro dos Contos de Fadas (Farie Tale Theatre no original) é um dos melhores exemplos disso. Criado e produzido pela talentosa e versátil atriz inglesa Shelley Duvall com o estúdio em parceria com a Gaylords Producition por volta de 1982, essa compilação de contos de fadas representadas em forma de mescla teatro e filme, mascou toda uma geração. No Brasil, a série de 26 episódios foi exibida pela TV Cultura em meados da década de 90. Quem acompanhou a grande programação infanto-juvenil semanal da emissora nessa época, certamente se recorda desta produção, que figura entre os fãs nostálgicos da emissora como um dos principais clássicos da TV Cultura.


Shelley Duvall

Essa diferente e original adaptação de famosos contos de fadas, foi elaborada, como já dito anteriosmente, por Shelley Duvall. Shelley já atuou em diversos filmes e é mais lembrada por fazer a esposa de Jack Nicholson no filme O Iluminado, de Stanley Kubrick e a Olívia Palito em Popeye. Distanciando-se um pouco da carreira de atriz, Duvall dedicou-se ao seu trabalho como produtora e dentre seus trabalhos, devem destacar a série que mencionamos nesse artigo.

O Teatro dos Contos de Fadas pode não ser visualmente mágico, e, para os padrões atuais (e mesmo para certos padrões da época) os efeitos visuais sejam deveras ultrapassados, mas isso, em momento algum diminui a credibilidade da obra. Como o nome diz, é um teatro que conta histórias; logo temos a sensação de assistir uma peça teatral ousada e com elenco talentoso e sempre diversificado.


Em todos os capítulos, contamos com a presença de Shelley Duvall, que recepciona o telespectador e apresenta a história em questão. A própria Shelley chegou a participar de alguns capítulos como personagem principal.
Os capítulos da série não seguem uma ordem cronológica, pois se tratam cada qual de um conto fechado. Porém se acompanharmos pela ordem em que foram produzidos, é possível notar uma sutil melhora nos efeitos visuais dos primeiros até os últimos episódios.




Como o próprio nome diz, Teatro dos Contos de Fadas narra magistralmente e com uma genial e afiada sequência de diálogos e eventos, diversos contos de fadas famosos e alguns nem tão famosos. São histórias de fantasia de diversos autores ao redor do mundo, com destaque para os contos dos Irmãos Grimm e Hans Cristian Andersen. Os contos narrados são deveras fiéis as obras originais e assim não é de suspreender quando vemos uma versão diferente de certos contos que conhecíamos pela Disney e livros infantis.
Porém, talvez o mais fascinante nessa série seja com relação ao elenco, diferente a cada capítulo. Quando somos crianças esses notáveis detalhes passam despercebidos e assim, quando tornamos a assistir, já adultos, somos acometidos por uma surpresa atrás da outra.
Citar todos os atores e atrizes conhecidas demandaria uma longa lista, de modo que talvez seja mais prático ressaltar capítulo por capítulo através da lista de episódios.


A Princesa e o Sapo – com diálogos afiados, temos a presença de Robin Willians como o sapo.

Rapunzel – fiel ao conto original, a adaptação conta com a própria Shelley Suvall como protagonista.

Os Três Porquinhos – o divertido conto ilustra bem a personalidade de cada porco e tem Jell Godblum no papel de lobo machão.

- Pinóquio – extremamente teatral e curiosamente estranho, podemos ver James Belush em um papel secundário.

A princesa que Nunca Sorria – um conto pouquíssimo conhecido, mas que ilustra uma princesa rebelde na atuação de Ellen Barkin.

- Rumpertliskin – o conto do maldoso duende novamente de Shelley Duvall como protagonista.

A Bela Adormecida – com base no conto original, reproduz a deliciosa história com o notável Cristopher Reeve no papel do valente príncipe.

João e o Pé de Feijão – deveras divertido com sua dramatização, o capítulo tem a presença de Nennis Cristopher. E a “vaca” é hilária.

O Dorminhoco – o misterioso conto torna-se sutilmente macabro sobre a direção expressionista de Francis Ford Coppola.

Cachinhos Dourados e os 3 Ursos – a divertida adaptação tem um ritmo constante com a simpática família urso e narração de Hoyt Axton.

A Bela e a Fera – um dos contos mais caprichados, tem Susan Saradon como Bella. As filmagens e a maquiagem da fera foram as mesmas utilizadas no filme de 1946.}

Alladin – fiel ao conto original, a história é divertida com pitadas de elemento gótico devido a direção de Tim Burton.

O Menino que Saiu de Casa para Descobrir o que era o Medo – um dos mais divertidos e assustadores contos possui um ótimo roteiro com a atuação de Cristopher Lee e narrado por Vicent Price.

- Mindinha – Uma história conhecida repleta de elementos típicos de fantasia com Carrie Fisher no papel principal. Muito reprisado na Cultura.

O Gato de Botas – O conto com elenco principal totalmente afro-americano conhecido na época que apimenta o humor.

A Princesa e a Ervilha – a melhor adaptação do conto, com roteiro hilário e excelente atuações teatrais de Liza Minelli e Tom Conti.

Cinderella – memorável e divertido, o destaque fica para a atuação de Matthen Broderick como o desajeitado e encantado príncipe.

O Flautista de Hamelin – o mais estranho e perturbador de todos os contos, fielmente recontado e com Eric Idle no papel do sinistro flautista.

Branca de Neve e os 7 Anões – o clássico contado capricha no destino da rainha e nos anões, tendo Elizabeth McGovern como Branca, Vanessa Redgrave como a cruel rainha e Vicent Price como o espelho mágico.

- Chapeuzinho Vermelho – divertido, o destaque fica mesmo para o lobo Reginaldo, interpretado pelo eterno “Alex de Large” Malcom McDowell.

A Pequena Sereia – o legitimo conto possui a melhor trilha sonora, a bela Pam Daneber como a Sereia e o final mais triste e belo de todos.

As Princesas Dançarinas – conto pouco conhecido, tem um ritmo leve e um casal que compete entre si, interpretados por Peter Wellerem.

O Rouxinol – a clássica fábula chinesa é contado em um ritmo lento mas o destaque fica para o imperador, vivido por Mick Jaeguer.

A Roupa Nova do Imperador – conto do monarca narcisista, viciado em roupas e repleto de trejeitos tem o versátil Dick Shawn no no papel principal.

- João e Maria – extremamente interessante, conta com o talento das crianças e Joan Collins como a sinistra bruxa da casa de doces.

A Rainha da Neve -  um dos contos mais lembrados e fascinantes, possui bons elementos e Lee Remick está excelente como a Rainha do Inverno.


Como pudemos ver, o Teatro dos Contos de Fadas possui participações de renomados e populares atores/atrizes da época. Embora eu tenha mencionado somente alguns, praticamente todos eram conhecidos por outros trabalhos. O que parece transmitir a sensação de que todos eles eram conhecidos de Duvall. E parece que se divertiam brincando em se tornar personagens de fábulas.

A série foi produzida entre o ano de 1982 e 1987 e, embora não tenha feito um estrondoso sucesso, fixou-se na memória de muita gente e até foi bem comentado na época. Quando foi exibida no Brasil na década de 90, fazia a alegria da garotada juntamente com os demais programas da emissora, fixando-se na memória. Eu digo porque sei.





Teatro dos Contos de Fadas é ousado e criativo, não com relação a efeitos especiais – que são em alguns casos bem chinfrins – mas em termos de roteiro.  Reavendo a essência das histórias na versão praticamente original (de acordo com os padrões oficiais) temos a chance de conhecer melhor elementos essenciais de certas obras que foram suprimidos ou alterados em produções da Disney, por exemplo. E também conhecendo contos pouco divulgados.

A forma como Duvall e sua equipo elaboraram o roteiro de cada história e a presença de conhecidos ilustres torna a série apreciável para o público de todas as faixas etárias. Aliás, talvez ele seja até melhor para a parcela adulta, que consegue tirar o proveito das ironias, dedicação dos artistas e referências discretas e diversas presentes em cada capítulo enquanto saboreia um nostálgico conto da infância.



Para quem gosta de fantasia e aprecia as histórias contadas na própria infância, Teatro dos Contos de Fadas é perfeito. Pois não é porque você tornou-se adulto que deva abandonar o estilo de histórias que tanto lhe agradou quando era criança. E para tornar a apreciar, não é preciso que as histórias de magia tornem-se contos bizarros, violentos, eróticos ou absurdamente psicológicos. Eles naturalmente e originalmente possui diversos elementos, disfarçados e ocultados de forma metafórica visíveis para aqueles que possam perceber e interpretar. E talvez seja exatamente por isso que essas histórias continuem atraindo o interesse a séculos, ora tendo contextos alterados e inovados para se adequar a época.

Shelley Duvall em seu Teatro dos Contos de Fadas foi cuidadosa em escolher as histórias abordadas, apresentando sua lição moral logo na introdução. A forma como os cenários são montados valorizam a idéia de teatro (como pode ser visto em Pinóquio) ou revivendo locais em que já foram realizado filmagens anteriores (isso ocorre no cenário de A Bela e a Fera), sem contar as adaptações para enriquecer o roteiro (recurso muito bem utilizado em A Princesa e a Ervilha) mantendo sempre o foco de manter a história original (como pode ser visto em A Pequena Sereia).


 


Além de recontar fábulas mundialmente conhecidas (como Cinderela), apresenta contos pouco conhecidos (A Princesa que Nunca Sorria) e fábulas de animais (Os 3 Porquinhos), a série ousa em apresentar contos que definitivamente não são infantis (O Flautista de Hamelin e O Dorminhoco). Há contos que valorizam conceitos (Cachinhos Dourados), contos que parecem mas não são tão infantis assim (Rapunzel), contos que utilizam metáfora (Chapeuzinho Vermelho) e por ai vai. Se eu fosse enumerar, este artigo se tornaria literalmente uma monografia.

Teatro dos contos de fadas é diferente, divertido e encantador. Uma pena que tenha apenas 26 capítulos, pois muitos contos poderiam ser explorados. É uma produção repleta de detalhes, referências e, acima de tudo, um sempre presente e nostálgico encanto.



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